quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

BARRA VELHA: O MELHOR LUGAR



Fonte:
http://diarydebicicleta.blogspot.com.br/2010/12/8-viagem-barra-velha-sc.html


Neste tempo comemorativo de três anos do Jornal Folha Parati e dos cinqüenta e um anos de emancipação política de Barra Velha, nosso lugar-comum, deixo de escrever sobre educação para escrever sobre o sentido do ninho, sobre o sentido do lugar de pertença, sobre o significado de viver e habitar neste município – casa de todos! Nosso lugar de pertencimento! Para isto, vou a um trecho retirado de um livro que recém escrevi intitulado ‘O Carregador de Pedras’:

“Ao abrir a porta da sacada, no novo apartamento de hospedagem, o carregador de pedras percebeu uma grande árvore que sustentava um pequeno ninho em um galho. Ficou observando por algum tempo o movimento dos pássaros que o visitavam em tempos intercalados para alimentar os filhotes. A árvore – uma de muitas na avenida – hospedava em sua copa uma família de pássaros que, por bom tempo, tecera cuidadosamente aquele ninho.
            Enquanto olhava, pensou: - Cada ninho tem uma arquitetura própria, um traçado, uma configuração representando o que tal pássaro é. Mostra seu jeito de ser pássaro na feitura do ninho. Todo ninho é abrigo, proteção, habitação e pertencimento, mesmo que seja por pouco ou muito tempo. São muitos os tipos de ninhos e variadas as suas formas. Nos ninhos imprimem os pássaros o que é mais forte em sua natureza. Deixam ali os traçados de suas vidas, definem a continuidade de seu viver.
            Ficou por um tempo contemplando o movimento dos pássaros e pensando sobre o sentido do ninho na vida deles. Absorto naquela imagética entre especulação e poesia, foi entrando em um universo paralelo e mergulhou no que a vida lhe apresentava de mais desafiador – a construção do seu lugar no mundo.
            Olhar a dinâmica dos pássaros permitia pensar a sua própria, o seu existir. Pensou alto – Muitas pessoas, nesse mundo, vivem longe de seus ninhos, distantes de seus lugares, dos seus espaços vitais. Muitos seguem em várias direções. Vão para aonde lhes convém ou podem em dado momento de suas histórias, sem jamais esquecer dos lugares onde habitaram, a que pertenceram. Outros, apenas frequentam determinados lugares sem poder habitar, pertencer e ser... Vivem vidas que não são as suas!..
            ...Os lugares que construímos para viver são únicos e só podem ser habitados por quem, de fato, lhes pertence. Habitar, não como ato de apenas estar, passar ou ficar, mas como ato de sentir-se, fazer-se parte, pertencer. Não habita com sentido quem não pode pertencer...
            ...A pertença é presença a se fazer cotidianamente. É movimento de tecelão que não se nega adicionar fios e cores identificadores do lugar que se faz sua criação e sua morada. Viver sem sentir, sem pertencer, sem coabitar... causa estranheza. Viver habitando, onde for e qual for o ninho, desde que se pertença... causa gozo, felicidade e força.
            A imagem do ninho estava levando o homem aos lugares de sua vida – lugares que construiu e onde, por algum tempo, habitou e aos quais pertenceu. Mesmo distante, estava em sintonia com os seus melhores lugares no mundo – sua casa e sua cidade. Não podia ficar afastado deles, por isso as lembranças, os momentos de recordação eram-lhe necessários. Ajudavam a continuar sua trajetória. Lembrar dos detalhes da casa – seu ninho –, dos momentos vividos nele, ampliava a confiança, a certeza de que precisava continuar, seguir até o final de sua viagem.
            Por um instante, aquele homem pensante pegou a mala das pedras, uma cadeira e sentou-se na sacada. Ficou ali segurando aquela mala e olhava a vida acontecer no ambiente externo. A avenida movimentada, a luta dos pássaros pela vida dos filhotes, as pessoas que passavam nas calçadas, o barulho dos carros. Ele estava ali naquele lugar porque havia feito uma escolha e uma promessa a si mesmo. Estava num lugar que não lhe pertencia, mas servia de ponte. Um momento necessário na vida de quem se aventurava a cumprir o que dava sentido a um viver carregado de cumplicidade, buscas e relações compromissadas.
            Pegou uma das pedras nas mãos e disse para si mesmo – não há lugar melhor no mundo a não ser o ninho no qual vivemos uns com os outros enfrentando tudo que a vida nos propõe e nos desafia a viver. Não há lugar melhor para se habitar e pertencer do que o lugar que construímos com as próprias mãos. O melhor lugar é o lugar onde posso estar com quem a vida me presenteou.
            Retirou outra pedra da mala e falou – se eu pudesse, diria para as pessoas aproveitarem em cada novo dia, novo agora, os cantos, os recantos, os detalhes, as minúcias dos lugares onde habitam. Olhassem em volta para perceber em cada minúsculo espaço um pouco de si mesmas, um pouco do que sonham, do que acreditam, do que esperam...
            ...Diria a elas que não deixassem de saborear os risos, as gargalhadas, os toques, os olhares, as falas, os sons e cheiros que circulam em cada recanto dos cantos onde vivem e aos quais podem pertencer. Olharia nos olhos de cada uma e diria para respirarem profundamente a vitalidade emergente do lugar que pode ser o melhor no mundo. Ele ficou na sacada até algumas luzes começarem a ser acesas. Era momento de se organizar para o jantar e rever os passos do dia seguinte” (NOGUEIRA, 2012). 

Parabéns, Barra Velha! Parabéns Folha Parati! Espaços de vida, de troca, de encontro. Espaços de compartilhamento das possibilidades e dos sonhos. Barra Velha, nosso ninho – espaço de pertença e de existência. Lugar de produção de sentidos e significados. Folha Parati, espaço-meio de diálogo e de informação; prática social fundamental na construção da cidadania crítica e atuante.

NOGUEIRA, Valdir.

domingo, 14 de outubro de 2012

O forjamento do Educador/Educadora.


 
Quinze de outubro é o dia do Professor. Por isso, faço uso deste espaço que criei para discutir os espaços-tempos comuns de vida da minha/nossa cidade, para parabenizar aos colegas Educadores/Educadoras e aqueles/aquelas em formação, pelo nosso dia partilhando um pouco da minha história.

 

Aos mestres, com carinho!

O forjamento do Educador/Educadora.

 
            Acredito que um educador se forja ao longo do fazer histórico e por meio dos caminhos que segue percorrendo. Não nasce pronto e acabado. Não é a graduação, nem a pós-graduação que o define e o faz concluso senão as muitas perguntas que ele mesmo coloca para si ao vivenciar tais processos formativos e ao experienciar os desafios da atuação profissional.

            Um educador forjado na inquietação produzida pela prática socioeducativa e pelo mergulho que faz nas muitas realidades vividas por ele e pelos demais sujeitos dos processos educativos, jamais se dá por pronto. Ele segue a vida desafiando-se a ver-se no não visto, a encontrar-se no não encontrado, pertencer ao não pertencido. Faz dos não-lugares, um lugar para si e para os outros que compartilham consigo as perspectivas de projetos-mundos e os caminhos da esperança.

            Minha forja socioeducativa começa quando entro na escola do Cotovelo, em 1978, na cidade de Barra Velha, hoje Escola David Pedro Espíndola. De lá até os dias atuais, percorri alguns caminhos de lutas e de possibilidades. Tive que ver no impossível o possível, acreditar no inacreditável! Quando cursava o ensino médio, sonhava com a faculdade, mas minha realidade de vida parecia dizer o contrário, como ouvi de um dos patrões da minha mãe (cozinheira de mão cheia) quando passei no vestibular para Geografia: “Filho de pobre entra, mas não conclui a faculdade”.

            Sou grato a minha mãe que fez o empréstimo antecipado de seu salário para pagar a matrícula da graduação iniciada no ano de 1993, na Univali – Itajaí/SC. Honrei minha família e o esforço de todos que me ajudaram na linda empreitada da formação acadêmica – pais, avós, tios, amigos. O ‘filho de pobre’ não só saiu da faculdade formado; fez Especialização, Mestrado, Doutorado, viajou para outros países e hoje sonha em fazer seu pós-doutorado. Um sonho-possibilidade que logo se concretizará. Um educador se forja não apenas pelo brilho teórico-metodológico ou pela competência acadêmica e prática que lhe define, mas também e, principalmente, pelos sonhos que alimenta, pelas possibilidades que enxerga, pelas esperanças que nutre, pela partilha que faz dos seus anseios de mundo, de sociedade, de vida.

            No mesmo ano, 1993, após engajamento na Pastoral da Juventude onde atuei por 18 anos, recebi convite para trabalhar em uma escola como professor de Educação Física para crianças da Pré-Escola. A Coordenadora dos grupos de catequese via em mim um potencial para trabalhar com crianças, pois à época eu trabalhava também com a catequese. Foi um lindo convite e um maravilhoso desafio! Eu não sabia ser professor, eu não tinha formação para ser educador a não ser as experiências vivenciadas por mim como aluno que carregava e carrego comigo até hoje, especialmente as experiências marcantes com os professores que potencializaram minha vida e meu viver.

            Um professor forjado na realidade de vida sua e de seus alunos é um encorajador de mentes e corações. Ele empodera o Ser dos sujeitos-alunos, amplia seus horizontes, desmistifica a realidade e os fatalismos, encorajando-os a ver além do aparentemente visto. A saírem de si mesmos e a apreenderem, quando retornam a si mesmos, fazerem-se mais com a realidade que é construída por eles e que está neles. Ele os revigora e os faz, criativamente, tornar a vida absurdamente possível.

            Ano que vem - 2013 completarei 20 anos de magistério. Destes, 10 anos em escolas públicas e os demais 10 anos divididos entre escola particular e universidades. Dez anos de trabalho no Magistério Superior, contribuindo com a formação de Pedagogos e professores nos diferentes níveis. Nesse tempo de escola pública, não me dei por vencido, nem me adaptei aos desmandos e aos ferrolhos da opressão e da minimização do Ser e do fazer (práticas) docentes. Ouvi muitos ditos: “Não venha pra cá com tuas teorias e teus discursos”; “Desista, agora tu começas com muita empolgação, mas depois tudo passa”; “Não adianta, esses alunos não tem condições” entre outros ditos e não ditos – olhares, gestos, atitudes e ações que falavam muito, eram coercitivos e degenerativos.

            Quando terminei o Mestrado, fui mandado para uma biblioteca de escola, era o lugar que me cabia, como diziam alguns, eu já estava falando demais. Não desisti dos alunos, não silenciei, não calei, continuei com minhas teorias e meus discursos, não me dei por cansado e não deixei morrer minha empolgação, não me curvei diante do falso poder e da opressão que escravizava/escraviza e faz sofrer muitos professores neste país. Em mim falavam mais alto meus sonhos e minha ousada determinação em querer mais, em ir mais longe, em ver de outras formas, em buscar perspectivas que me ajudassem a entender tudo o que me acontecia e também o que nos acontecia nos muitos espaços-tempos do aprender.

            Um professor forjado na efervescência do fazer socioeducativo precisa, não de vez enquanto, ma sempre, insistir, persistir, resistir, acreditar, revolucionar. A maior força, a mais poderosa energia capaz de mover mundos, de desinstalar sistemas, de provocar mudanças e transformações está dentro dele, está com ele, está nele: sua capacidade ilimitada de acreditar que a vida, ainda que frágil, é a mais poderosa possibilidade no mundo. Eu ainda não sabia disso, meus estudos, minhas teorias, minhas buscas, minhas inquietações, meus desencontros e encontros com tantos outros ajudaram a chegar nesta fantástica descoberta.

            O que move meu universo de educador é essa arrebatadora vontade de defender a vida em todas as suas dimensões. Impossível não acreditar nisso quando olhava para os olhos de um aluninho e via para além daquele olhar o seu desejo de ser mais, de fazer-se mais, de transcender sua realidade; impossível não acreditar naqueles e naquelas que me escreviam bilhetinhos de agradecimento porque eu os procurava entender; impossível não acreditar na beleza do encontro com os muitos colegas que me ajudavam a fazer um planejamento, a encontrar os caminhos mais favoráveis a uma prática educativa libertadora; impossível não acreditar no valioso respeito compartilhado entre os pares – professoras e professores que ao invés de me deixar de fora, me colocavam para dentro – dentro das trocas solidárias de saberes, dentro das rodas de conversa e de partilha da vida, sofrida em muitos momentos, mas dignificada pelo carinho, pela acolhida, pela ternura emergida nos intervalos, nos recreios, nas reuniões.

            Foram muitos os colegas que me ajudaram a construir pontes, derrubar muros, atravessar altas marés, criar caminhos; foram as gentes da educação que me deram apoio e me permitiram continuar fazendo minha história. Por isso, um educador forjado na solidariedade, no compartilhamento altruísta, na respeitosa convivência, na co-responsabilidade, na escuta atenta e no olhar curioso jamais pode se dar por acabado, jamais pode se dar por concluso. Um educador forjado nesse território fértil de embates e de valores segue fazendo sua história acreditando que a vida ainda não revelou, não descortinou tudo o que ela precisa desvelar/descortinar; segue acreditando que é preciso confiança na capacidade humana de amar e de libertar; segue acreditando que os sentidos são construídos desde que se possibilite a si mesmo e aos outros o exercício da extraordinária capacidade de sonhar os sonhos possíveis.

            Meu sonho, talvez seja do tamanho do mundo, mas acredito que seja possível de realização. Meu sonho é que a VIDA e tudo o que há nela, seja, estupendamente VALORIZADA, RESPEITADA, CUIDADA, EMPODERADA! Sonho com a qualificação do viver das gentes desde as favelas, morros, becos até os grandes centros. Sonho mesmo é com os sonhos das crianças que ainda passarão pelas escolas. É com este ato sonhado e que acredito possível que parabenizo a todos nós, Educadores e Educadoras deste país e, em específico, desta terra (Barra Velha) que me ajudou a tornar-me o professor que sou. Parabéns para nós!

 
Lembro aqui e agradeço os espaços de atuação profissional:

 
Escola Antonia Gasino de Freitas, onde comecei minha experiência docente, em 1993; Escola Manoel Antonio de Freitas, onde continuei minhas incursões pelo fazer docente (1998) e onde aprendi que a Educação é uma prática política, como afirma Freire; a Escola Astrogildo Odon Aguiar, onde estudei desde a 5ª Série ao Ensino Médio e onde, por pouco tempo (2001), atuei como professor do Ensino Médio; Escola David Pedro Espíndola, onde sem saber, iniciei minha caminhada de aluno-sujeito (1978) e onde por pouco tempo trabalhei como substituto (1999), no ensino religioso - lá também desenvolvi minha pesquisa de doutorado; à Educação de Jovens e Adultos, à época CEJAM onde atuei como professor e Coordenador e muito aprendi com a Educação de Jovens e Adultos; à APAE de Barra Velha, onde juntos construímos o PPP e com os parceiros de diálogos muito aprendi sobre o valor das diferenças e dos diferentes; ao Centro Educacional Canguru, onde atuei como professor dos Anos Finais e por um tempo como Assessor Pedagógico; ao Centro Universitário de Jaraguá do Sul – UNERJ, hoje PUC, onde iniciei meus caminhos na atuação no ensino superior, em Barra Velha e posteriormente, em Jaraguá do Sul; ao SENSUPEG onde trabalhei nos cursos de Especialização; à UNIASSELVI, onde atuei como professor na formação dos Pedagogos, em Barra Velha; aos muitos lugares e recantos dos Estados do Sul e deste país onde proferi palestras e falei das minhas teorias ideias seja assessorando na construção dos PPPs e matrizes curriculares, ou apenas falando e partilhando inquietações comuns e pontos de vistas e perspectivas outras de mundo e de educação; à Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, onde me encontro trabalhando na formação de professores - Pedagogos-Pedagogas; às escolas já citadas no município de Barra Velha e à Escola de São João do Itaperiú – Elvira Faria Passos, onde desenvolvi os estudos do mestrado e da tese de doutorado; enfim a todos aqueles e aquelas que estão em mim e fazem parte do profissional que tenho me permitido ser, meu mais sincero obrigado e que possamos seguir, fazendo história e, com isso, Ser neste mundo, a diferença.
 
NOGUEIRA, Valdir.